No dia 16 de maio de 2024, o auditório da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) foi palco do seminário “Desafios Contemporâneos da Regulação”, reunindo especialistas de renome para debater o presente e o futuro da regulação no Brasil. O evento trouxe à tona as transformações normativas que impactam os serviços públicos, especialmente nos setores de saneamento, infraestrutura e parcerias público-privadas (PPPs).
Organizado com o objetivo de fortalecer o diálogo entre reguladores, operadores de serviços e formuladores de políticas, o seminário abordou temas como padronização regulatória, regionalização, reequilíbrio contratual, tarifas sociais, adaptação às mudanças climáticas e governança em contratos de PPPs e concessões.
Entre os momentos de maior destaque do evento estiveram o Painel 2, que tratou da relação entre regulador e regulado, e o Painel 3, voltado aos aspectos críticos da regulação em contratos de PPPs e concessões. Ambos trouxeram insights valiosos para quem atua na formulação e gestão de projetos públicos com participação privada.

Painel 2 – Desafios da relação entre o regulador e o regulado
Com moderação de Rafael Castilho, coordenador dos MBAs em PPP e Saneamento Ambiental da FESPSP, o painel contou com as contribuições de Demétrius Jung Gonzalez (Agesan-RS/Abrasa), Luciane Domingues (Sabesp), Luiz Roberto Del Gelmo (DAE Jundiaí) e Marcelo Spilki (Agergs). O debate teve como foco os desafios da comunicação regulatória, a equidade nas tarifas sociais e os entraves na implementação de políticas públicas em contextos socioeconômicos diversos.
Comunicação transparente e regionalização das políticas tarifárias
Um dos principais pontos debatidos foi a comunicação das mudanças tarifárias à população. Embora os serviços de saneamento tenham avançado em diversas regiões, os palestrantes apontaram que a aceitação social das tarifas ainda é limitada, sobretudo quando a comunicação não é clara ou quando não leva em conta as realidades locais.
Jundiaí foi citado como exemplo positivo, ao conseguir implementar a cobrança de esgoto com ampla aceitação da população, resultado de um processo bem conduzido de escuta pública e transparência.
Tarifas sociais e exclusão digital
Outro destaque foi o impacto da nova exigência que condiciona o acesso à tarifa social ao cadastro no CadÚnico. A mudança deixou aproximadamente 450 mil domicílios fora do benefício, gerando exclusão de parte significativa da população vulnerável. Segundo os debatedores, a realidade territorial precisa ser considerada com mais profundidade — o que funciona em São Paulo pode não ser viável no Maranhão, e vice-versa.
A fragmentação das políticas públicas e a dificuldade de aplicar regras uniformes em um país tão desigual foram amplamente discutidas. A falta de instrumentos regulatórios que considerem essa diversidade regional dificulta o avanço da universalização do saneamento.
Resíduos sólidos e resistência política
A regulação das tarifas de resíduos também foi debatida como um ponto sensível. Muitos municípios enfrentam resistência política ao tentar implementar cobranças mais justas e sustentáveis, o que compromete a qualidade dos serviços e a preservação ambiental. A ausência de consenso político e a falta de uma narrativa que explique a importância desses tributos à sociedade agravam a situação.
Para os participantes do painel, a chave está na construção de confiança com a população, que só será possível por meio de transparência, escuta ativa e adaptação das políticas às realidades locais.

Painel 3 – Aspectos críticos na regulação de contratos de PPP e Concessões
Com mediação de Carlos Nascimento, coordenador do MBA PPP e Concessões da FESPSP, o terceiro painel reuniu Felipe Mahana (Habita SP e Velar SP), Flávia Tâmega (Arteris S.A.), Marcelo Fonseca (ANTT) e Thiago Nunes (ARSESP). O foco esteve voltado à complexidade da regulação nos contratos de PPPs e concessões, especialmente em contextos de imprevisibilidade econômica, mudanças climáticas e transformações normativas.
Contratos de longo prazo e reequilíbrio econômico-financeiro
Os especialistas reforçaram que contratos de PPP e concessão, por sua própria natureza de longo prazo, exigem cláusulas mais robustas para lidar com incertezas. O reequilíbrio financeiro tornou-se uma necessidade recorrente, dado o contexto de inflação, mudanças cambiais, variações na demanda e alterações regulatórias.
Flávia Tâmega, da Arteris, destacou que a previsibilidade regulatória é um dos principais atrativos para o capital privado, e que a ausência dela pode comprometer a viabilidade de projetos inteiros.
Arbitragem e governança contratual
A adoção de mecanismos de arbitragem e mediação foi apontada como estratégia essencial para resolver conflitos de forma mais ágil e técnica. Marcelo Fonseca, da ANTT, trouxe a experiência do setor de transportes, destacando que a existência de câmaras de arbitragem bem estruturadas permite que os contratos avancem mesmo diante de divergências complexas.
A governança dos contratos, por sua vez, foi colocada no centro do debate. Segundo os painelistas, não basta ter boas cláusulas contratuais — é preciso ter capacidade institucional para acompanhar, fiscalizar e ajustar os contratos ao longo do tempo.
Novos setores regulados e a experiência da ARSESP
Thiago Nunes apresentou os desafios enfrentados pela ARSESP, que passou a regular setores como educação, serviços funerários e habitação social. Em todos os casos, a regulação enfrenta resistência e desconfiança inicial por parte dos entes regulados, exigindo transparência, diálogo técnico e construção conjunta de soluções.
Além disso, Nunes enfatizou que a regulação precisa ser responsiva, ou seja, capaz de se adaptar rapidamente a novas realidades, sem abrir mão da segurança jurídica. Esse equilíbrio, segundo ele, é o que garante o bom funcionamento dos contratos e a proteção do interesse público.

Um futuro regulatório mais transparente, adaptável e participativo
O Seminário “Desafios Contemporâneos da Regulação” reafirmou a necessidade de uma regulação moderna, flexível e conectada às realidades do território brasileiro. Os dois painéis analisados neste post mostram que, tanto nas relações entre regulador e regulado quanto na estruturação de contratos de PPPs e concessões, há um denominador comum: a importância do diálogo constante, da transparência e da capacitação institucional.
Com uma abordagem crítica e colaborativa, o evento promovido pela FESPSP e seus programas de MBA contribui significativamente para o amadurecimento do debate sobre a regulação no Brasil. E mais do que isso: reforça o papel da formação técnica e da gestão pública qualificada como caminhos indispensáveis para uma infraestrutura mais justa, eficiente e sustentável.
Para quem atua no setor de PPPs, infraestrutura ou saneamento, os aprendizados do seminário são um chamado à ação: é hora de repensar modelos, integrar saberes e fortalecer as instituições reguladoras. Afinal, sem boa regulação, não há bons serviços públicos – nem parcerias que durem.
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